Arquivo para março \30\+00:00 2010

Menos um.

A porta ta aberta e isso não é um convite.
To te mandando embora, sem cerimônias.

E você pode ir assim. Sem dar uma desculpa. Sem sair pela tangente.
Antes que você tenha que pensar num jeito de sair quando o assunto acabar, eu to te dando a oportunidade de tornar isso bem mais simples. Não que você tenha escolha. É só um jeito diferente de ver as coisas, se ainda tiver como deixar isso agradável pra alguém.

Não quero conviver com seu egoísmo. Não quero ter data e nem hora pra acabar. Não quero essa frieza absurda que eu não entendo como é que todos vocês conseguem ter. Não quero entrar na sua vida já pensando em sair. Não quero uma conversa burra, não quero um beijo de mentira. Não quero um diálogo que não existe. Não quero ouvir como é difícil pra você, se você não consegue perceber o quanto é difícil pra mim. Não quero te escrever textos. Não quero seus planos. Não quero seu zelo temporário. Não quero essa paranoia estúpida. Não quero me desgastar, não quero cair pra ter que começar a levantar mais uma vez. Não quero encontrar pedaços seus por aí. Não quero procurar pela sua inteligência. Não quero me esforçar pra admirar você. Não quero esperar por você. Por uma resposta, uma reação, uma conversa, uma desculpa, um sofrimento. Nem por uma culpa.

Tô te mandando embora porque você já é visita que passou da hora. Visita que não devia ter vindo. Visita que vem pra casa do parente pra não pagar hotel. Porque é conveniente. Não consigo me desfazer de tudo isso com você aqui. Então te mando embora.

E na hora que você sair, der três passos e olhar pra trás, eu vou olhar pra você e dizer: não importa o quanto eu insista. Não volte.

Corredor 5. Uma mulher. Um homem. Umas cervejas. E um arroz integral. Gravando.

Compras. To fazendo compras. Quero tirar uma foto e mandar pra minha mãe. Mãe, cresci. Moro sozinha e to fazendo compras pela primeira vez. Tem alguma câmera me filmando? Cadê o gerente? Queria uma cópia. Queria pedir pra melhorar a música. É minha primeira compra, gerente. Dá um desconto. Minha vida ta mudando hoje. To comprando sabão, panela, arroz. Plantinhas. Eu nunca pensei que ia comprar plantinhas. E agora, o que acontece? Minha amiga conheceu um namorado fazendo compras. Eu podia conhecer alguém. Ia contar pra minha mãe também.  Ela nunca acreditou que um dia eu ia comprar sabão e plantas. E não anda acreditando que eu sou capaz de um dia conhecer alguém que preste. Mas eu to comprando sabão, to comprando plantas. O próximo passo me parece meio óbvio. Mãe, tem um cara me olhando. É sério. Deixa eu ver. É gatinho, mãe. Um cara fazendo compras, que lindo. Não deve ser mimado. Preciso de um homem assim. Independente. Que trabalhe. Pague suas contas. Deixa eu chegar mais perto pra ver. Não mãe, não vou dar em cima dele. Só quero ver o que ele compra. Tem cerveja. Muita cerveja. Cerveja pra caramba. Bom. Ele sabe aproveitar a vida, deve ser divertido, não quero ninguém careta do meu lado. Também tenho uma cervejinha aqui. Mas também tem comida. Ele pensa em mais coisas além de cerveja. Eu podia pedir uma informação pra ele. Podia esbarrar no carrinho sem querer. Podia sei lá, puxar um papo bobo. Vou rir pra ele… ta bom, mãe, não vou rir. Mas ele já viu que eu olhei. TA VENDO MÃE, ele falou comigo. Eu disse. Minha vida ta mudando. Ele quer saber do arroz, ele come arroz integral, eu to sonhando, mãe? Ta. Calma. Deixa eu pensar. Esse arroz integral tem que render. Já sei. A loja do meu tio. Fica aqui atrás. Mas olha, to aqui comprando porque não fico sem. Mas tenho um tio que tem uma loja que vende esse arroz aqui bem mais barato. Funcionou. Funcionou. Ele pediu meu telefone. Ninguém pede o telefone a toa num supermercado. É sério, eu quero uma cópia da imagem da câmera. Chama o gerente.
Mãe. To apaixonada.

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Cerveja. Onde ta a cerveja? Cerveja é o tipo de coisa que tinha que estar na entrada. Sempre. Aqui não ta. Cadê o gerente? Eu quero achar a cerveja. Achei. Marcão me falou que aqui é bom porque abre até mais tarde. E quem vem fazer compra mais tarde é mais interessante que quem vem fazer compra no horário normal. Não que eu queira arrumar mulher no supermercado. Mas se for gatinha, gostosinha, carinha de… opa. Me deu mole. Deu mole, Marcão, você tava certo. Ninguém ia me dar mole a tarde. Te amo, Marcão. A mina ta sozinha, a essa hora, fazendo compras. Não é casada. Não mora com os pais. Não tem hora pra chegar em casa. Ta me olhando muito. Acho que ela quer dar pra mim. Ela tem cerveja. Beleza. Assim que eu gosto. Cheia das frescuras no carrinho. Plantinha, arroz integral, comida de passarinho. Não tem problema. Me deu mole, é gatinha, tem cerveja, to dentro. E agora, Marcão? Como é que chega numa mulher dentro dessa porra? Tem que rolar essa coisa de por acaso, eu acho. Ei… dá licença. Onde você achou esse arroz? Beleza, gata. É isso aí, facilita pro meu lado. Vamo lá, arroz integral, tem na loja do tio dela, é mais barato… beleza. É agora. Ah, que bom saber. Posso pedir pra você me dar um toque pra eu registrar seu telefone? Numa boa mesmo. To sem meu celular aqui, sem nada pra anotar o endereço da loja. Sabe como é… não fico sem. Mandei bem? Mandei bem, pô. Vou levar essa comida toda pra minha mãe e passo aí pra gente tomar essa cerveja. Amanhã ligo pra ela. Você gosta de arroz integral? Vou te dar isso.
Marcão. Me dei bem.


O que tem aqui

Diálogos, monólogos, conversas, crônicas, histórias malucas e talvez, quem sabe, até reais, de uma cabeça bem esquisita.